quinta-feira, 10 de setembro de 2009

As criticas que recebiam a Chanchada e o seu fim

Por Me Segura Qu'eu Vou Dar Um Troço

O fim dos filmes do gênero Chanchada está intimamente ligado ao surgimento da Tv no Brasil, que absorve seus atores e a comédia tão característica feita no cinema brasileiro, herdando a cultura do rádio que permeava o cinema popular. Não tendo mais tanta renda para se manter, as companhias cinematográficas vão se extinguindo, permanecendo os produtores independentes.

Os filmes do gênero Chanchada sempre incomodaram a elite e a intelectualidade, insatisfeitas por representarem o povo brasileiro nas telas do cinema. Este foi um dos fatores que as fizeram acabarem. Existia uma pressão muito forte sobre estes filmes. E as críticas eram muitas vezes estampadas em jornais da época: “‘Chega de Abacaxis’, ‘Degradam nossa cultura e impedem o surto de nosso verdadeiro cinema’. ‘Os decretos protecionistas em vez de abrir lugar para bons empreendimentos, apenas amparam a mediocridade’.
Para muitos dos críticos, com o fim da Chanchada, finalmente o cinema brasileiro acabaria com o amadorismo e começaria a produzir filmes de qualidade internacional. No momento de emitir juízos de valor estético sobre e qualificar/interpretar as comédias cariocas (‘baixo nível’, ‘humor Chulo’) carrega-se o peso de uma concepção oriunda da antiguidade clássica (Grécia) e que foi perpetuada ao longo da história do ocidente. Ao criar fronteiras, separando claramente os gêneros, esta faceta da tradição ocidental valoriza a tragédia ou o drama em detrimento do cômico. Pode-se perceber esta teoria observando o pensamento de Aristóteles, que constrói uma hierarquia privilegiando a tragédia em detrimento da comédia.

Os críticos sempre associavam a chanchada ao subdesenvolvimento e isto se tornou uma regra. Mas quando começaram a perceber a chanchada pelas teorias de Mikhail Bakhtin, mudaram a percepção que tinham sobre o cômico, pois a cumplicidade do público brasileiro com a chanchada demonstrou na verdade, um possível desejo de transformação social. Isto está ligado às idéias de M. Bakhtin, principalmente suas idéias sobre a carnavalização.

O carnaval na concepção de Bakhtin é mais do que uma festa, é a cultura opositora do oprimido, onde o mundo é visto de baixo, não tem distinção de rico ou pobre no carnaval, sendo totalmente igualitário. Invertendo a ordem dos valores, o mundo vira de ponta cabeça. O carnaval coroa e destrói, ele arranca de seus tronos monarcas e coloca hilariantes reis da bagunça em seus lugares, todas as distinções hierárquicas, todas as barreiras, todas as normas e proibições são temporariamente suspensas, estabelecendo-se um novo tipo de comunicação, não existindo barreiras para abordar outras pessoas e falar o que se pensa na folia. O carnaval, para Bakhtin, gera um tipo especial de riso festivo, constituindo um instrumento particularmente adequado para a investigação do cinema brasileiro, que sempre foi profundamente carregado de valores culturais associados ao carnaval.

As paródias sofreram vários preconceitos em relação à comédia, como forma “inferior”, em relação a trocadilhos e jogos de palavras eram considerados como a forma mais baixa de humor, em relação a palhaçadas físicas e pancadarias, eram consideradas grosseiras e vulgares e em relação ao público, popular de classe baixa. Percebe-se que esses preconceitos têm em comum a noção de alto/baixo, superior/inferior, que é percebido na teoria de Bakhtin sobre a carnavalização, ou seja, fazendo a associação do elemento paródico chanchada, na concepção da “carnavalização” de Bakhtin percebe-se que a paródia adapta-se bem às necessidades dos oprimidos e impotentes, exatamente porque assume a força do discurso dominante, só para aplicar essa força, através de um duro golpe artístico, contra a dominação.

Mantendo-se como filmes inofensivos ao mercado cinematográfico estrangeiro, os filmes da Chanchada que tinham como características elementos cômicos ou carnavalizados, não teriam seu poder de distribuição e exibição ameaçado, podendo ter uma grande divulgação e distribuição sem que sejam incomodados por ninguém. Imitação, avacalhação e degradação são alguns dos termos que se usava para desvalorizar os filmes da chanchada, garantindo um aspecto cômico da própria realidade brasileira. Essas referências reservam à linguagem da Chanchada uma relação com as festas populares, o circo, o carnaval, o rádio e o teatro de revista, que dialogaram com o cinema nacional, aprimorando o entendimento de uma cultura popular de massa, em torno de um modelo subdesenvolvido.

O filme “Carnaval Atlântida” exemplifica literalmente a idéia de carnavalização de Bakhtin, não só através do seu título, como também por meio dos seus procedimentos e referências fundamentais. Para se fazer um filme mais modesto e sem toda aquela pompa do filme “Helena de Tróia”, alguns personagens aconselham o diretor Cecílio B. De Milho, paródia do nome de um grande diretor hollywoodiano chamado Cecil B. de Mille, a abandonar o épico e a fazer um filme de carnaval.

Nenhum comentário: